dezembro 17, 2008

O tempo não é o movimento dos corpos



Se alguém me disser que o tempo é o movimento de um corpo, mandar-me-eis estar de acordo? Não mandareis. Ouço dizer que os corpos só se podem mover no tempo. Vós mesmo o afirmais. Mas não ouço dizer que o tempo é esse movimento dos corpos. Não o dizeis. Quando um corpo se move, é com o tempo que meço a duração desse movimento desde que começou até acabar. Se não o vi principiar a mover-se e persevera, de modo a não poder notar quando termina, só me é permitido medir a duração do movimento desde o instante em que comecei a vê-lo até que o deixei de ver. Se o presencio por longo espaço, não posso dizer quanto tempo demorou, mas somente que demorou muito tempo, porque o quanto só por comparação o podemos avaliar. Dizemos, por exemplo, que "isto durou tanto quanto aquilo", que "isto durou o dobro daquilo" e de modo semelhante, nos outros casos. Se pudermos observar de que lado vem o corpo que se move e para onde vai, ou se as suas partes se movem como um torno, poderemos dizer quanto tempo durou de um lugar a outro o movimento deste corpo ou das suas partes.
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Portanto, sendo diferentes o movimento do corpo e a medida da duração do movimento, quem não vê qual destas duas coisas se deve chamar tempo? Num corpo que umas vezes se move com diferente velocidade e outras vezes está parado, medimos não somente o seu movimento mas também o tempo que está parado. Dizemos: "Esteve tanto tempo parado como a andar" "ou esteve parado o dobro ou o triplo do tempo em que esteve em movimento", e assim por diante. Ainda no cálculo exato ou aproximativo, costuma-se dizer "mais" e "menos".
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Portanto, o tempo não é o movimento dos corpos.
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in Confissões; Santo Agostinho – Vozes – Petrópolis, RJ, 1987
Ilustração: The Chinese Smile – Pintura anônima do Séc. XVIII

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