março 02, 2007
Sete Haicais
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1
Assustada, a velha pula da cadeira, se debruça na cama:
– João. Fale comigo, João.
Geme fundo, abre o olhinho vazio, soluça um palavrão:
– Bruuuxa... diaaaba...
– Ai, que susto. Graças a Deus.
2
Deitados na cama. Ele vestido, até de óculo. Ela, todinha nua. O homem ordena que apague a luz. Ela obedece, volta para a cama, estende a mão.
– Não. Não faça isso. Não diga nada.
Bem quietinha, percebe que se consola sozinho.
3
– Por que não quer viver comigo? Acha que sou um monstro?
– Bonito, sabe que não é.
– Você gosta do cara?
– Nem tanto.
– Mais dele que de mim?
– ...
– Só porque sou preto?
4
– Ai, que moça deliciosa. Quase não falou. Até o silêncio era inteligente. Sorriso triste, é verdade. Mas que dentes, que olhos!
– Lili? Fraca da idéia, coitada. Não desconfiou pelo sorriso? Até hoje molha na cama.
5
O velho compra um naco de queijo e avisa:
– Se você pega eu te corto em pedacinho.
A velha tem de pegar quando limpa o armário. Daí recebe um tapa na orelha, dois empurrões e cai sentada.
– Conheceu, sua diaba?
6
– Você anda de romance com outro.
– Vou me encontrar com um: homem. E daí?
– Cuidadinho, menina.
– Já não presta na cama. Você não é de nada.
– E quem paga o teu dentinho de ouro?
7
Nhô João, perdido de catarata negra nos dois olhos:
– Me consolo que, em vez de nhá Biela, vejo uma nuvem.
in Pão e Sangue; Trevisan, Dalton – Record – Rio de Janeiro, 1988
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