fevereiro 12, 2007
Dobradura
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Estamos, agora, em condições de compreender o anti-semita. É um homem que tem medo. Não dos judeus, certamente: de si próprio, de sua consciência, de sua liberdade, de seus instintos, de suas responsabilidades, da solidão, da modificação da sociedade e do mundo; de tudo salvo dos judeus. g um covarde que não quer confessar sua covardia; um assassino que recalca e censura sua tendência ao homicídio sem poder refreá-la e que, no entanto, só ousa matar em efígie ou no anonimato de uma multidão; um descontente que não se atreve a revoltar-se por receio das conseqüências de sua revolta. Aderindo ao anti-semitismo, não adota simplesmente uma opinião, mas se escolhe como pessoa. Escolhe a permanência e a impenetrabilidade da pedra, a irresponsabilidade total do guerreiro que obedece a seus chefes, e não tem chefe. Escolhe não adquirir nada, não merecer nada, mas que tudo lhe seja dado de nascença – e não é nobre. Escolhe enfim que o Bem seja um fato consumado, fora de dúvida, fora de alcance, não ousa encará-lo por medo de ser levado a contestá-lo e a ter que procurar outro. O judeu não é no caso senão um pretexto: em outra parte, será utilizado o negro e, em outra, o amarelo. A existência do judeu permite simplesmente ao anti-semita sufocar no embrião suas angústias, persuadindo-se de que seu lugar sempre esteve consignado no mundo, que esse lugar o esperava e que possui, por tradição, o direito de ocupá-lo. O anti-semitismo, em suma, é o medo diante da condição humana. O anti-semita é o homem que deseja ser rochedo implacável, torrente furiosa, raio devastador: tudo menos homem.
in Reflexões sobre o racismo; Sartre, Jean-Paul – Difusão Européia do Livro – São Paulo, sd
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