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...O sagrado Coração de Jesus houve por bem servir-se de mim, a mais indigna desta Communidade, para dar um exemplo brilhante de sua infinita misericordia.
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...Remetto á Reverendissima Madre a relação do milagre feito em nosso favor. Em Roma, porém, já está um documento minucioso acêrca do occorrido, que traz as assignaturas não sómente de todas as nossas Irmãs, mas ainda do Exmo. Sr. Bispo e de uma commissão de sacerdotes.
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...Na noite de 16 de Janeiro, estava eu sériamente adoentada, a braços com graves difficuldades. (1) O relogio acabava de dar tres horas da madrugada, quando quasi exhausta de forças, soergui-me a custo no meu leito parar respirar um pouco mais á vontade, e adormeci.
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...Parece-me que, em sonho, senti o contacto de uma mão que me vinha agasalhar carinhosamente, conchegando-me o cobertor ao rosto. Imaginei logo que uma das minhas Irmãs viéra prestar-me este serviço, movida de attenciosa caridade, e sem abrir os olhos, limitei-me a dizer-lhe: «Deixe-me assim mesmo, que estou banhada em suor; o movimento que está fazendo me resfria demasiadamente.»
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...Uma voz meiga e desconhecida respondeu-me:
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...«– Não, o que estou fazendo é muito acertado.» – E continuando a agasalhar-me, accrescentou: – «Oiça... o nosso bondoso Deus vale-se dos habitantes celestes como se serve dos moradores desta terra para soccorrer os seus servos. Aqui tem 500 francos, para pagar as dividas da sua Communidade.»
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...Observei-lhe que a divida da nossa Communidade orçava apenas por 300 francos, ao que replicou: «– Pois bem, o restante ficará de sobra. Porém, visto como não póde conservar este dinheiro na sua cella, venha commigo.»
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...Essa agora, disse eu de mim para mim, como é que me posso levantar, alagada em suor como estou? A celeste visão, perscrutando o meu pensamento, acudiu logo a sorrir: «A bilocação ha de resolver o caso.»
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...No mesmo instante achei-me fóra da minha cella, em companhia de uma irmã Carmelita, muito joven ainda, cujo hábito e véo deixavam transparecer um clarão de Paraiso, que nos valeu para atinar com o caminho.
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...Levou-me até ao andar térreo, á sala da roda, pediu que abrisse um cofrezinho de madeira, onde estava encerrada a nota da divida da Communidade e lançou nelle os 500 francos! Tomada de admiração e não cabendo em mim de alegria, cahi de joelhos a testemunhar-lhe a minha gratidão: «– Minha santa Madre!...» exclamei jubilosa. Ella porém travou-me do braço, pedindo que me levantasse e entre demonstrações de carinho e meiguice replicou-me: «Não, eu nao sou a nossa santa Madre, SOU A SERVA DE DEUS, SOROR TERESA DE LISlEUX. No céo e na terra festeja-se hoje o Santissimo Nome de Jesus.»
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...Senti-me tão commovida e enleada, que já não atinava com a resposta; mais com o coração do que com os labios exclamei ainda: «Ó minha Madre...» e não pude ir adeante. A angelica Irmã encostou a mão no meu véo a modo de o querer endireitar e depois de me acariciar fraternalmente, afastou-se a passos lentos. Acudi-lhe pressurosa dizendo: – «Espere lá um boccadinho, olhe que póde não acertar com o caminho!» – Ella porém esboçou um sorriso celeste e me respondeu: «Não tenha receio, não; O MEU CAMINHO É SEGURO, E NÃO ANDEI ENGANADA EM O SEGUIR...»
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...Acordei, e não obstante o meu estado de prostração, apeei da cama e desci até o Côro onde recebi a santa Communhão.
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...As Irmãs olnavam para mim visivelmente assustadas e, movidas de compaixão ao vêr-me tão quebrantada, tencionavam chamar o medico.
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...Passei pela sacristia e as duas sacristãs instaram commigo porque lhes manifestasse o que sentia, porfiando para que me recolhesse á cama e mandasse vir o medico. Querendo obviar a tudo isso, confessei-lhes que a impressão de um sonho me havia deixado commovida e referi-lhes o occorrido, sem rodeios e com toda a simplicidade.
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...A instancias daquellas duas religiosas que me pediam lhes fosse abrir o pequeno cófre, respondi que se não devia acreditar em sonhos.
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...Tanto fizeram e tão porfiadamente insistiram, que afinal me dobrei aos seus desejos: fui á roda, abri o cofrezinho e... nelle encontrei realmente a milagrosa quantia de 500 francos!...
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...Não ha entre nós quem se não sinta confusa, á vista de tanta gentileza e bondade; suspiramos todos ardentemente pela hora abençoada, em que se concedam as honras dos altares á Irmãzinha Terêsa, nossa grande protectora.
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SOROR CARMÉLA DO CORAÇÃO DE JESUS
r. c. i. –priora
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(1) o Carmelo de Gallipoli achava-se naquella epoca reduzido á mais extrema penuria. A Madre Priora tivéra a inspiração de fazer um triduo em honra da SSma. Trindade, escolhendo para medialneira junto de Deus Soror Terêsa do Menino Jesus, cuja vida mandára lêr poucos mezes antes a toda a Communidade.
O triduo terminava precisamente naquelle mesmo dia 16 de janeiro.
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in Santa Terêsa do Menino Jesus; tradução P. Amando Adriano Lochu, S. J. – Livraria Salesiana Editora – São Paulo, 1925
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