julho 16, 2020

João Rosa


























Hem? Hem? O que mais penso, testo e explico! todo-o-mundo é louco. O senhor, eu, nós, as pessoas todas. Por isso é que se carece principalmente de religião! para se desendoidecer, desdoidar. Reza é que sara da loucura. No geral. Isso é que é a salvação-da-alma... Muita religião, seu moço! Eu cá, não perco ocasião de religião. Aproveito de todas. Bebo água de todo rio... Uma só, para mim é pouca, talvez não me chegue. Rezo cristão, católico, embrenho a certo; e aceito as preces de compadre meu Quelemém, doutrina dele, de Cardéque. Mas, quando posso, vou no Mindubim, onde um Matias é crente, metodista! a gente se acusa de pecador, lê alto a Bíblia, e ora, cantando hinos belos deles. Tudo me
quieta, me suspende. Qualquer sombrinha me refresca. Mas é só muito provisório. Eu queria rezar ― o tempo todo. Muita gente não me aprova, acham que lei de Deus é privilégios, invariável. E eu! Bofe! Detesto! O que sou? ― o que faço, que quero, muito curial. E em cara de todos faço, executado. Eu? ― não tresmalho!


ROSA, Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: José Olympio, 1956.