julho 08, 2007

Sumaúma


De pequenino se torce o pepino


Os mano

Amore — L. Bonfaro

Odio — L. Bonfaro
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in Novissima – Albo d'Arti e Lettere; Direttore: Fonseca, Edoardo de – Roma, 1904

Boi na linha


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(aparece a ema, enorme, correndo, dança junto depois, para junto do boi vazio e olha, espantada)

EMA — Ué! Cadê o recheio do boi? O boi esvaziou? Cadê o de dentro do boi?

ATOR — Eu estou aqui. O de dentro do boi, sou eu!

VIOLEIRO
O boi é boi só por fora,
o boi é gente por dentro
gente é seu sentimento
em qualquer dia e qualquer hora!
O boi é boi só por fora,
o boi é gente por dentro,
gente é seu sentimento,
na hora em que o boi vai embora!
Boi, por dentro, também chora!

EMA — Então, o boi é igual à Ema! Eu também sou gente por dentro. Quando alguém me maltrata, sofro igualzinho à gente!

VIOLEIRO — Você também é gente, por dentro, Ema? Você também tem sentimento?

EMA — Tenho. Também sou gente, por dentro. Igual a todo bicho! Igual a toda a gente!

VIOLEIRO — Então, Ema, sai de dentro, vem prá fora!

EMA(se requebrando, metendo a cabeça debaixo da plumagem) Eu tenho vergonha. Fico toda envergonhada!

TODOS, EM VOLTA DA EMA — Sai de dentro, vem pra fora, sai de dentro, vem pra fora, sai de dentro, vem pra fora...

Trecho de A Folia dos Três Bois; Orthof, Sylvia – SBAT, Revista de Teatro, nº 460 – Rio de Janeiro, 1968

julho 07, 2007

Noir


La Notte – Augusto Majani, Bologna

in Novissima – Albo d'Arti e Lettere; Direttore: Fonseca, Edoardo de – Roma, 1904

Auto da Barca do Inferno




in Teatro; Vicente, Gil – Livraria Lello & Irmão – Porto, sd

Auto da Feira


...A peça tem prólogo, dito por Mercúrio, que, discreteando sôbre astronomia, usa de sentenças semelhantes às do prólogo da «Exortação da Guerra». No final, diz quem é e ao que vem: que por não conhecer na côrte de Portugal feira no dia de Natal, ordena ali uma, nomeando mercador-mor ao Tempo. Entra êste, anunciando várias mercadorias, entre elas a Justiça, a Verdade, a Paz, o Temor de Deus, etc. A seguir vem um Serafim e convida para a feira os mosteiros, as igrejas, os pastores de almas, «os papas adormidos», a quem exorta a que regressem à vida humilde e simples dos primitivos tempos da Igreja.
...Aparece o Diabo, «como bufarinheiro», e gaba-se de que há de vender com tôda a facilidade a sua avariada mercadoria. Discute o assunto com o Tempo e com o Serafim.
...Surge Roma, a Igreja, que vem comprar Paz, Verdade e Fé. Gil Vicente, pela boca do Diabo, dirige-lhe cruéis censuras e ataques.
...Desenvolve-se depois uma scena de dois compadres lavradores, que, a caminho da feira, falam das respectivas mulheres, uma brava, outra mansa, mostrando-se cada um dêles descontente com a sua. Surgem as mulheres e censuram os respectivos maridos, cujos defeitos apontam. Chegam à feira. Como uma das mulheres pronuncia a palavra —Jesus—, o Diabo desaparece. Dirigindo-se ao Tempo e ao Serafim, preguntam por mercadorias várias e enjeitam as que esses vendedores apregoam, como consciência, virtude, etc.
...Aparecem mais raparigas e rapazes, ordenam-se para feirar, e estabelece-se entre êles uma troca de ditos amorosos, que tornam animada a scena. Até que por fim todos cantam uma «folia» à Virgem em honra de quem se ordenara a feira.

in Teatro; Vicente, Gil – Livraria Lello & Irmão – Porto, sd

Epitáfio

No túmulo de Gil Vicente, em Évora, na Igreja de São Francisco:

«O gram juizo esperando
jaço aqui nesta morada
também da vida cansada
descançando.
Pergunta-me quem fui eu
atenta bem para mi
porque tal fui coma ti
e tal has de ser com'eu.
E pois tudo isto vem
ó lector, de meu conselho
toma-me por teu espêlho
olha-me e olha-te bem. »

julho 06, 2007

Amor le fa cantare


Il Ballo delle Rondini (Francesca da Rimini) – Luigi Brunelli, Milano

in Novissima – Albo d'Arti e Lettere; Direttore: Fonseca, Edoardo de – Roma, 1904

Segundo Ato

Leopoldo Fróes era impetuoso, exaltado. Desde tenra idade manifestou sua autoridade quando exigia os punhos e colarinhos engomados, ou quando mandava fritar três e quatro bifes até que ficassem ao seu gôsto.

Filho criado sem mãe, o pai sereno e gentil, não tinha a energia que o gênio impulsivo do garôto necessitava. Sua tia Yayá, carinhosa, sempre se recordando de que as crianças eram órfãs passava-lhes a mão pelas cabecinhas, e, muita vez, ocultava do Dr. Fróes suas travessuras e peraltices.

E o pricipiante ator Leopoldo Fróes correu a província do velho Portugal.
Na revista "A Volta do Mundo em 80 dias", Fróes fazia o papel de um brasileiro em Portugal.

Um ator da companhia, antipatizou com Fróes. Despeito, talvez, do jovem brasileiro que já demonstrava sua vocação teatral.

Numa cena em que havia uma briga, o ator português, aproveitando a oportunidade para se vingar do rapaz estrangeiro, por quem sentia uma antipatia gratuita, dirigiu-se ao colega dizendo:

— Vais ver, brasileiro, o que é um português. Assim dizendo deu um formidável pontapé em Leopoldo. Coisa que agradou ao grupo de colegas amigos do agressor.

Fróes, lembrou-se dos seus tempos de rapazola, quando treinava a "capoeira" no quintal de sua casa, lembrou-se dos capangas, nas esquinas das ruas nos dias de eleições no Brasil, lembrou-se do prêto Cipriano que o livrara e aos amigos, da surra dos cocheiros de bonde, e, respondeu ao ator que o ofendera:

— Vais ver o que é um brasileiro. E sapecou um "rabo de arraia" jogando por terra os seus antipatizantes que caindo sentados no chão tão bruscamente tiveram que evitar sentar-se por alguns dias.. .

A cena agradou. O público, que não se apercebera de que estava assistindo provocação e revide à valer, aplaudia a cena. Mas no espetáculo seguinte a cena foi moderada... e nos bastidores dizia-se a meia voz: "cuidado com o brasileiro... quem poderia esperar... um rapaz tão fino!"

Êsse incidente não teve importância. O rapaz continuou espalhando simpatia por onde andava e respeito aos atrevidotes.

Outra ocasião, Fróes estava vestido de rei para representar uma peça histórica. No fundo do palco havia um grande espelho, onde os artistas se miravam, antes de entrar em cena. Fróes teve uma altercação com um colega, palavra puxa palavra e de repente Fróes sentiu-se ofendido com qualquer coisa que lhe dissera o colega. Fróes, colérico, nos seus vinte e um anos de idade, sem pensar nas conseqüências, num gesto de tragédia, como pedia a "toillette" que vestia no momento, desembanhou a espada que trazia à cintura e investiu contra o colega.

Mas, Leopoldo, estava justamente em frente ao espelho do fundo do palco e, ao ver-se refletido naquela atitude grotesca, com uma cabeleira à inglêsa, meias altas, couraça no peito e um grande manto caído nas costas, deu uma gargalhada. O colega que esperava uma surra de espada, ao ouvir as risadas dobradas de Fróes, saiu correndo, julgando que o artista havia enlouquecido... Aí a cena tornou-se ainda mais cômica, tudo acabou bem, foi um rompante de seu gênio impulsivo.

Leopoldo Fróes cada vez mais se empolgava pela terra de seus avós, o sereno João Francisco da Cruz e o altivo Comendador Rodrigues Guimarães. Portugal a sua segunda pátria.

A estréia de Leopoldo Fróes numa grande companhia teatral, foi no Teatro Príncipe Real, em Lisboa, no dia 18 de novembro de 1903, na peça "O Rei Maldito", de Marcelino Mesquita. Fêz sucesso nesse grande teatro como já o fizera em outros de menor cartaz no Brasil e Portugal.

Começou a estudar e a exercitar a prosódia portuguêsa. Trabalhando em Portugal, com artistas portuguêses, era preciso que sua pronúncia não "desafinasse dos demais".

Em pouco tempo era um "alfacinha" falando.

Em 1905 ingressou na companhia José Ricardo — Teatro da Rua dos Condes. Aprendeu teatro. Dizia sempre Fróes que José Ricardo foi seu grande mestre.

Seu primeiro triunfo — substitui o galã Telmo. A crítica ocupa suas colunas com justos elogios ao ator brasileiro. Fróes não se envaidece, mas quer vencer.

Lembra-se da Pátria distante. Sente o sangue de artista latejar-lhe nas veias. Desdobra-se em esforços. Vence.

Começa aí sua vida entre conquistas. Conquistas artísticas e femininas...

Conheceu uma atriz — Maria Portuzellos, fadista de beleza extraordinária com quem passou a viver e trouxe-a consigo na primeira viagem ao Brasil, como ator.

Leopoldo e Maria viviam uma vida à apaches. A mulher que lhe tinha um ciúme doentio não o deixava um só instante. Aquilo enfezava-o. Brigavam. Faziam as pazes. Ambos geniosos as brigas eram violentas. Ambos muito jovens as pazes eram também violentas...

Certa ocasião, em Niterói, onde residiam, na Rua Saldanha Marinho, a portuguêsa no auge do ciúme deu-lhe uma dentada na mão. Leopoldo foi obrigado a recorrer à uma botica e o médico, antigo amigo, perguntou-lhe:

— Que bicho te mordeu, Popodo?

— Mulher, doutor. Respondeu-lhe Fróes.

Tendo terminado o contrato da companhia que o trouxe de volta á Pátria, deu uns espetáculos avulsos em vários teatros do Rio levando o drama de Discenta — "João José ", no qual fazia o papel de André, papel que foi sempre o seu nessa peça. Maria Portuzellos fazia a Rosa, agradando à platéia com sua beleza.

Maria era linda, ignorante e boa. Era uma fadista, alma de "Severa", cantava fados que Leopoldo acompanhava à guitarra e amava-o. Era um amor brutal.

De uma feita Luís Carlos foi visitar o mano Leopoldo e sua companheira Maria. O garôto, aproveitando a ausência do pai, que estava na Europa, escolheu uma artística bengala de sua coleção e lá saíu todo lampeiro convencido de que era um homem feito, com apenas 16 anos.


Prof. Luiz Carlos Fróes da Cruz (pai de Leopoldo) e D. Idalina da Conceição Rodrigues Guimarães Fróes da Cruz (mãe de Leopoldo)


Fróes em Lisboa (jovem ator) e Fróes em Paris


Leopoldo (4 anos) e Corinna (5 anos) no seu primeiro diálogo "A Floresta e o Estudante"

Encontrou um ambiente carregado — Leopoldo e Maria discutiam. A discussão tornou-se em briga. Leopoldo com aquêle gênio de rompantes, no auge da raiva agrediu Maria, essa repeliu-o, sem delicadeza alguma, é claro. Vai daí Leopoldo apanha a bengala que estava num canto encostada à parede e suspende-a para quebrar as costelas da portuguêsa.

Luís deu um grito de horror:

— Não, Popodo!... com essa bengala, não!... que é de papai!

Leopoldo e Maria desataram a rir... a briga terminou.

Maria, rindo, beijou o garôto Luís Carlos:

— Se a bengala não fôsse do papai.....

***

in Leopoldo Fróes; Fróes, Iris – Companhia Nacional de Teatro; MEC – Rio de Janeiro, 1960

Lúmen


La Lucciola – Carlo Balestrini, Milano

in Novissima – Albo d'Arti e Lettere; Direttore: Fonseca, Edoardo de – Roma, 1904

junho 25, 2007

Dissertação terceira

Qual é o fim de todo o ideal ascético?
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"Despreocupados, mentirosos, violentos,
assim nos quer a sabedoria. É mulher
e não gosta senão de guerreiros?"
Assim falava Zaratustra.



I

Qual é a tendencia de todo o ideal ascético? Entre os artistas ás vezes não significa nada e ás vezes significa multiplices coisas; entre os filósofos e os sábios, um instinto favoravel para uma grande espiritualidade; entre as mulheres, um encanto mais, um pouco de morbidez, um anjinho gorducho, entre os desequilibrados (isto é entre a maioria dos mortais) uma tentativa de se encontrar muito bem neste mundo, uma fórma sagrada da libertinagem, uma arma capital contra a dôr e o tédio; entre os sacerdotes, a verdadeira fé sacerdotal, o seu melhor instrumento de poder, o seu melhor direito ao governo; entre os santos, um pretexto para o sonho de inverno, uma novissima gloria cupido, o repouso no nada ("Deus"), uma manifestação da demencia. Em suma, de toda esta diversidade de finalidades no ideal ascético do homem, resulta o caráter essencial da vontade humana, o seu horror ao vácuo; necessita de uma finalidade, e prefere querer o nada antes que não querer. Explico-me? Compreenderam-me? "Parece-me que não!" Comecemos, pois pelo principio.

in A genealogia da moral; Nietzche, Frederico – Edição da Organização Simões – Rio de Janeiro, 1953

junho 17, 2007

Arranha



zonza aranha
na aramina
desfalece
a quebradiça
tumba
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Anna de Ló
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maio 22, 2007

O otimismo

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O otimismo, para que tudo dê certo, é muito mais que meio caminho andado. A larga maioria dos nativos rega tal convicção com inextinguível desvelo, mesmo quando tudo dá errado. Isso vale ao torcer pelo seu time, ao planejar os negócios, ao sonhar com o amor. Se você exerce o espírito crítico, se tenciona pesar com um mínimo de realismo os prós e os contras, expõe-se à pecha de amargo, pessimista, inimigo da pátria. O que equivale a querer o mal dos semelhantes, talvez a provocá-lo — e assim faz sentido, pois se otimismo gera o bem, o que haverá de suscitar seu oposto, o pessimismo?
Como se vê, os nativos não confiam em si mesmos, e sim na interferência do sobrenatural, o qual, não se sabe por que, estaria sempre à espreita da ocasião de agir em seu proveito.

Anotação no caderno de apontamentos, manuscrita.

in O castelo de âmbar; Carta, Mino – Record – Rio de Janeiro, 2000

maio 20, 2007

Consilium profectiones meæ


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Cōnsĭlĭŭm, ĭī, s. ap. n. (de consulere).
1º Deliberação; decreto; autoridade; 2º Resolução, plano, projeto, desenho, desígnio, vistas; expediente; saída; 3º Conselho, voto, parecer, sentimento, o sentir; 4º Prudência, moderação, circunspeção, razão; recurso do espírito; 5º Assembléia, deliberação, conselho; comissão; conselheiro. § 1º Consilium capere cum aliquo. TER. — conferre cum aliquo. CIC. Deliberar com alguém. In consilium ferre aliquid. QUINT. Pôr alguma coisa em deliberação. Quum iretur in consilium. CIC. Quando se ia para deliberar. Quasi consilii sit res. CÆS. Como se a coisa fosse assunto de deliberação. Magni consilii est. CIC. É assunto de grande momento, é mister examinar maduramente. Mei, tui consilii est. NEP. CIC. Cumpre a mim, a ti o vêr. Meum, tuum consilium est. CIC. O m. q. o preced. Fit publici consilii particeps. CIC. Toma parte nas deliberações do senado. Consilio publico. CIC. Por decreto do senado. Id non publico fecit consilio. NEP. Fez isto sem caráter público. Navis quæ privato consilio administrabatur. CÆS. Navio que pertencia a partlculares. § 2º Consilium intendere. TER. Fomar um projeto. — cepit patefacere iter. LIV. Tomou a resolução de abrir um caminho. — cepi ut exirem. CIC. Resolvi-me a sair. — capere cibi. CÆS. Tratar apenas de si. — abjicere ædificandi. CIC. Deixar-se de edificar. — profectiones meæ. CIC. Meu projeto de partir. Consilii inops. SUET. Irresoluto, que não sabe o que há de fazer. Est consilium. TER. SALL. Estar resolvido, é coisa assentada. Eo consilio, uti... NEP. Na intenção de que... Consilio. LIV. VIRG. De propósito, de caso pensado. Sine consilio. CÆS. Sem plano formado, ao acaso. Tali consilio. NEP. Com tal expediente. Consilia cujusquemode Gallorum. CÆS. Toda a sorte de expedientes dos Gauleses. § 3º Consilia dare. TER. CIC. Dar conselhos. De consilio alicujus. CIC. Segundo o parecer de alguém. Consilio meo. TER. Por meu conselho. — locorum. SIL. Segundo aconselhava a natureza dos lugares § 4º Consilium amisisti? TER. Perdeste o juízo? Infirmitas consilii. CIC. Fraqueza de espírito. Vir magni consilii. CÆS. LIV. Homem de grande saber. Consilii plenus. NEP. Cheio de recursos. Majore studio quàm consilio. SALL.Com maior empenho do que prudência. Ignes consilii inopes. OV. Amor louco, insensato. Vis consilii expers. HOR. A força sem sabedoria. § 5º Senatus, id est, orbis terræ consilium. CIC. O senado, isto é, o conselho do universo. Venire in consilium tyranni. CIC. Entrar em o conselho d'um tirano. Duobus consiliis vicimus. PLIN. J. Vencemos em dois tribunais. Consilium castrense, ou militare. LIV. Conselho de guerra. Consilia sortiri semestria. SUET. Tirar à sorte as comissões semestrais. Pugnæ consilium fuit. OV. Foi aconselhada a peleja.

in Dicionário Latino-Português; Saraiva, F. R. dos Santos – Garnier – Rio de Janeiro, 2000 — Ilustração: Silos Roberto Meira

maio 19, 2007

Salvamento de Evangelina


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Da janela, Saint-Clare e Miss Ofélia viram Eva brincando com pai Tomás, sentado num banco do jardim, tendo ao redor do pescoço muitas flores.

A Miss Ofélia a cena não agradou. Era contra os maus tratos infligidos aos negros, mas deles não se aproximava por causa de instintiva repugnância.

Pai Tomás sentia-se satisfeito com os novos senhores. Estava bem instalado. Deram-lhe uma linda cabana para morar. Andava bem vestido. Trabalhava pouco, não porque evitasse o serviço, mas por causa de Eva, que não o abandonava. Sua felicidade seria completa se estivessem a seu lado Cloé e os filhos, os filhinhos... Quando neles pensava, o que era freqüente, os olhos umedeciam-se. A saudade... Negro também tem saudade e tem olhos para chorar...

Um dia Saint-Clare ao passar perto da cabana ouviu vozes. Prestou atenção. Era pai Tomás que, em voz um pouco alta, ajoelhado, rezava. Pedia a Deus por sua mulher, pelos filhos, pelo seu senhor, por Eva. Saint-Clare afastou-se impressionado e comovido.
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in A Cabana do Pai Tomás; Stowe, H. B. – Melhoramentos – São Paulo, 1952 — Ilustração de Parlagreco

maio 18, 2007

Uma tipologia sentimental

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Um prostituto propõe uma classificação singular dos clientes segundo sua experiência subjetiva:

— O cliente piedoso: "Compassivo, aparece com um discurso do tipo: 'você tem que deixar essa vida, tem que transar por amor porque vai se arruinar'. Dá todo tipo de conselhos, acreditando que assim a gente não vai cobrar ou vai cobrar menos. Ou vai ter compaixão do seu jeito de bonzinho para não arrebentar ele. Embora a gente pegue o relógio dele, o cara não reage, continua dando umas de mártir".

— O cliente depressivo: "São terríveis, caras que estão acabados, querendo se suicidar, choram, embebedam-se, provocam nojo e lástima. Um caso: o cara gemia, choramingava, podia ter roubado tudo, mas senti pena".

— O namorado: "Ficam apaixonados pela gente, perseguem, querem morar junto, prometem tudo. Insuportáveis. Um deles não me deixava faturar, enchia o saco no pedaço, como eu nem ligava ameaçou-me de morte, tive que sair um tempo do pedaço porque era séria a coisa, ele estava maluco e era capaz de fazê-lo".

in O negócio do michê, prostituição viril em S. Paulo; Perlongher, Osvaldo Néstor – Brasiliense – São Paulo, 1987 — Foto: Inêz Guerreiro

verso & frente


frente


O operário em construção


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E o Diabo, levando-o a um alto monte, mostrou-lhe num momento de tempo todos os reinos do mundo. E disse-lhe o Diabo: — Dar-te-ei todo este poder e a sua glória, porque a mim me foi entregue e dou-o a quem quero; portanto se tu me adorares, tudo será teu. E Jesus, respondendo disse-lhe: — Vai-te, Satanaz; porque está escrito: adorarás o Senhor teu Deus e só a ele servirás.
LUCAS. Cap. V. vs. 5-8


ERA ELE que erguia as casas
Onde antes só havia chão.
Como um pássaro sem asas
Ele subia com as casas
Que lhe brotavam da mão.
Mas tudo desconhecia
De sua grande missão:
Não sabia, por exemplo
Que a casa de um homem é um
Um templo sem religião
Como tampouco sabia
Que a casa que ele fazia
Sendo a sua liberdade
Era a sua escravidão.

De fato, como podia
Um operário em construção
Compreender por que um tijolo
Valia mais do que um pão?
Tijolos ele empilhava
Com pá, cimento e esquadria
Quanto ao pão, ele o comia...
Mas fosse comer tijolo!
E assim o operário ia
Com suor e com cimento
Erguendo uma casa aqui
Adiante um apartamento
Além uma igreja, à frente
Um quartel e uma prisão:
Prisão de que sofreria
Não fosse, eventualmente
Um operário em construção.

Mas ele desconhecia
Esse fato extraordinário:
Que o operário faz a coisa
E a coisa faz o operário.
De forma que, certo dia
À mesa, ao cortar o pão
O operário foi tomado
De uma súbita emoção
Ao constatar assombrado
Que tudo naquela mesa
— Garrafa, prato, facão —
Era ele quem os fazia
Ele um humilde operário
Um operário em construção.
Olhou em torno: gamela
Banco, enxerga, caldeirão
Vidro, parede, janela
Casa, cidade, nação!
Tudo, tudo o que existia
Era ele quem o fazia
Ele, um humilde operário
Um operário que sabia
Exercer a profissão.


Ah, homens de pensamento
Não sabereis nunca o quanto
Aquele humilde operário
Soube naquele momento!
Naquela casa vazia
Que ele mesmo levantara
Um mundo novo nascia
De que sequer suspeitava.
O operário emocionado
Olhou sua própria mão
Sua rude mão de operário
De operário em construção
E olhando bem para ela
Teve um segundo a impressão
De que não havia no mundo
Coisa que fosse mais bela.
Foi dentro da compreensão
Desse instante solitário
Que, tal sua construção
Cresceu também o operário.
Cresceu em alto e profundo
Em largo e no coração
E como tudo que cresce
Ele não cresceu em vão
Pois além do que sabia
— Exercer a profissão —
O operário adquiriu
Uma nova dimensão:
A dimensão da poesia.


E um fato novo se viu
Que a todos admirava:
O que o operário dizia
Outro operário escutava.
E foi assim que o operário
Do edifício em construção
Que sempre dizia sim
Começou a dizer não.
E aprendeu a notar coisas
A que não dava atenção:
Notou que a sua marmita
Era o prato do patrão
Que sua cerveja preta
Era o uísque do patrão
Que o seu macacão de zuarte
Era o terno do patrão
Que o casebre onde morava
Era a mansão do patrão
Que os seus dois pés andarilhos
Eram as rodas do patrão
Que a dureza do seu dia
Era a noite do patrão
Que sua imensa fadiga
Era amiga do patrão.
E o operário disse: Não!
E o operário fez-se forte
Na sua resolução.
Como era de se esperar
As bocas da delação
Começaram a dizer coisas
Aos ouvidos do patrão.
Mas o patrão não queria
Nenhuma preocupação.
« ...Convençam-no» do contrário
Disse ele sobre o operário
E ao dizer isso sorria.


Dia seguinte, o operário
Ao sair da construção
Viu-se súbito cercado
Dos homens da delação
E sofreu por destinado
Sua primeira agressão.
Teve seu rosto cuspido
Teve seu braço quebrado
Mas quando foi perguntado
O operário disse: Não!


Em vão sofrera o operário
Sua primeira agressão
Muitas outras se seguiram
Muitas outras seguirão
Porém, por imprescindível
Ao edifício em construção
Seu trabalho prosseguia
E todo o seu sofrimento
Misturava-se ao cimento
Da construção que crescia.


Sentindo que a violência
Não dobraria o operário
Um dia tentou o patrão
Dobrá-lo de modo vário.
De sorte que o foi levando
Ao alto da construção
E num momento de tempo
Mostrou-lhe toda a região
E apontando-a ao operário
Fez-lhe esta declaração:
— Dar-te-ei todo esse poder
E a sua satisfação
Porque a mim me foi entregue
E dou-o a quem bem quiser.
Dou-te tempo de lazer
Dou-te tempo de mulher.
Portanto, tudo o que vês
Será teu se me adorares
E, ainda mais, se abandonares
O que te faz dizer não.


Disse, e fitou o operário
Que olhava e que refletia
Mas o que via o operário
O patrão nunca veria.
O operário via as casas
E dentro das estruturas
Via coisas, objetos
Produtos, manufaturas
Via tudo o que fazia
O lucro do seu patrão
E em cada coisa que via
Misteriosamente havia
A marca da sua mão.
E o operário disse: Não!


— Loucura! — gritou o patrão
Não vês o que te dou eu?
— Mentira! — disse o operário
Não podes dar-me o que é meu.
E um grande silêncio fez-se
Dentro do seu coração
Um silêncio de martírios
Um silêncio de prisão.
Um silêncio povoado
De pedidos de perdão
Um silêncio apavorado
Como o mêdo em solidão.
Um silêncio de torturas
E gritos de maldição
Um silêncio de fraturas
A se arrastarem no chão.
E o operário ouviu a voz
De todos os seus irmãos
Os seus irmãos que morreram
Por outros que viverão.
Uma esperança sincera
Cresceu no seu coração
E dentro da tarde mansa
Agigantou-se a razão
De um homem pobre e esquecido
Razão porém que fizera
Em operário construído
O operário em construção.

in O operário em construção; Moraes, Vinicius de – Dom Quixote – Lisboa, 1986 — Ilustração: Kasimir Malevich; Haymaking, 1927-29

O lar e a Religião


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... Em sua ultima viagem, em 1886, ao interior de S. Paulo, o Imperador Pedro II visitava uma escola, quando uma menina de oito annos, a mandado da professora, começou a recitar o Credo. Em certa altura, quando a pequenita dizia que Jesus fora concebido de Maria Virgem, “virgem antes do parto, durante o parto e depois do parto”, o monarcha interrompeu-a e, voltando-se para a educadora:
— Não accrescente nada ao Credo; esta oração é a synthese completa da nossa religião. Nem entre na questão da Conceição, que é um dogma muito recente.
... E virando-se para um jornalista:
— A religião deve ser ensinada pelas proprias mães; só na falta d'estas é que pode ser confiada á professora.

Mucio Teixeira — “O Imperador visto de perto”, pág. 116.

in O Brasil Anecdotico; Campo, Humberto de – Leite Ribeiro – Rio de Janeiro, 1927

maio 17, 2007

Dueto

DIE BEIDEN ESEL

Ein finstrer Esel sprach einmal
zu seinem ehlichen Gemahl:

»Ich bin so dumm, du bist so dumm,
wir wollen sterben gehen, kumm!«

Doch wie es kommt so ôfter eben:
Die beiden blieben fröhlich leben.

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OS DOIS BURROS

Um burro macambúzio e mal com a sorte
diz, certa vez, à legítima consorte:

Eu sou tão burro e você é tão burra.
Morramos logo! — ele fala, ou zurra.

Mas, como sói acontecer freqüente,
vivos ficaram, zurrando alegremente.

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—o—

AUF DEM FLIEGENPLANETEN

Auf dem Fliegenplaneten,
da geht es dem Menschen nicht gut:
Denn was er hier der Fliege,
die Fliege dort ihm tut.

An Bändern voll Honig kleben
die Menschen dort allesamt,
und andre sind zum Verleben
in süssliches Bier verdammt.

In Einem nur scheinen die Fliegen
dem Menschen vorauszustehn:
Man bäckt uns nicht in Semmeln,
noch trinkt man uns aus Versehn.
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NO PLANETA DAS MOSCAS

No planeta das moscas, o homem
não se acomoda nada bem:
pois o que aqui faz às moscas
elas lhe fazem lá, também.

Grudar em cartões melados
uma pessoa atrás de outra
e sendo muitos condenados
a boiar em cerveja doce.

Só num ponto se mostram as moscas
aos homens superiores: elas não
nos assam em broas ao forno,
nem nos bebem por distração.

in Canções da fôrca; Mogenstern, Christian – Roswitha Kempf – São Paulo, 1983

O


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Nesse momento, como num relâmpago, foi atravessada pela certeza de que ele a amava, que em seguida se dissipou. Embora não o acreditasse e ainda se recriminasse por tê-lo imaginado, isto a reconfortou e, a um gesto dele, tirou a roupa docilmente. Então, e pela primeira vez desde que Sir Stephen a fazia vir duas ou três vezes por semana usando-a lentamente, muitas vezes fazendo com que esperasse nua por uma hora antes de aproximar-se, escutando sem nunca responder às suas súplicas, pois às vezes suplicava, repetindo as mesmas injunções nos mesmos momentos — como num ritual, tão bem sabia quando sua boca devia acariciá-lo e quando, de joelhos, com a cabeça afundada na seda do sofá devia oferecer-lhe apenas suas nádegas — que agora possuía sem ferir mais, de tal modo tinha-se aberto para ele, pela primeira vez, então, apesar do medo que a decompunha, ou talvez mesmo por causa deste medo, apesar do desespero onde a tinha jogado a traição de René, mas talvez também por causa deste desespero, entregou-se completamente. E pela primeira vez, tão doces eram seus olhos que, ao encontrarem os olhos claros e ardentes de Sir Stephen, consentiam, que ele falou em francês, com muita intimidade. “O”, disse, “vou ter que amordaçá-la pois gostaria de chicoteá-la até o sangue. Permite?”. “Eu sou sua”, disse O. Estava de pé no meio da sala com os braços levantados e unidos que os braceletes de Roissy mantinham presos à argola do teto, onde antigamente havia um lustre, por uma pequena corrente, o que fazia seus seios saltarem. Sir Stephen acariciou-os, beijou-os e depois beijou sua boca uma vez, dez vezes. (Nunca an-

in A história de O; Réage, Pauline – Brasiliense – São Paulo, 1985

Clavado en la silla



Haga sentar cómodamente al sujeto en uma silla, la espalda descansando en el respaldo. Colóquese usted parado delante de él. El sujeto debe de mirar verticalmente, tendrá, por consecuencia, la cabeza algo vuelta hacia arriba. Epere un momento; usted observará bien pronto que el sujeto manifiesta un ligero movimiento de deglución. Digale entonces, com voz firme: “Usted no se puede levantar; usted está en la imposibilidad absoluta de levantarse. Ensaye usted; no puede levantarse.” Y diciendo esto concentre su voluntad para que el sujeto quede pegado a la silla. El sujeto hará grandes esfuerzos para levantarse, pero sus tentativas serán inútiles; él quedará pegado a la silla.

in Curso completo de sugestion; D’Artis, Profesor – Gr. Salvadó – Barcelona, 1957

Paradoxo XVII


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— Oi
Eu
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— Ei Ou
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perdeganha
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maio 15, 2007

Parabenza


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Veja o que dizem obras conceituadas sobre a origem da celebração dos aniversários natalícios:

Le livre de religions, uma enciclopédia amplamente distribuída na França, classifica este costume como rito e o insere entre “ritos seculares”. Embora hoje as comemorações de aniversários sejam consideradas um inocente costume secular, na realidade têm suas raízes no paganismo.

Os autores Ralph e Adelin Linton revelam os motivos subjacentes disso. Escrevem no seu livro The Lore of Birthdays: “A Mesopotâmia e o Egito, berços da civilização, foram também as primeiras terras em que os homens lembravam e honravam seus aniversários natalícios. A guarda de registros de aniversários natalícios era importante, nos tempos antigos, principalmente porque a data do nascimento era essencial para se fazer um horóscopo.” A ligação direta com a astrologia é motivo de grande preocupação para todos os que evitam a astrologia por causa do que a Bíblia diz sobre ela.
— Isaías 47:13-15.

Não surpreende, portanto, que leiamos na Enciclopédia Delta Universal: “Os primeiros cristãos não celebravam [o] nascimento [de Cristo] porque consideravam a comemoração do aniversário um costume pagão.” — Volume 10, página 5608.

Não se pode negar, porém, que numerosas obras de referência revelam os antecedentes supersticiosos e religiosos das celebrações de aniversários natalícios. The Encyclopedia Americana (edição de 1991) comenta: “O mundo antigo do Egito, da Grécia, de Roma e da Pérsia celebrava os aniversários natalícios de deuses, reis e nobres.” Diz que os romanos celebravam o nascimento de Ártemis e o dia de Apolo. Em contraste com isto, “embora os antigos israelitas mantivessem registros da idade dos cidadãos do sexo masculino, não há evidência de que realizassem festividades no aniversário do nascimento”.

Outras obras de referência entram em consideráveis pormenores sobre a origem das celebrações de aniversários natalícios: ‘As festas de aniversários natalícios começaram anos atrás na Europa. As pessoas criam em espíritos bons e maus, às vezes chamados de fadas boas e más. Todos temiam que esses espíritos prejudicassem o aniversariante, de modo que ele ficava cercado de amigos e parentes, cujos votos de felicidade, e sua própria presença, o protegeriam contra os perigos desconhecidos que o aniversário natalício apresentava. Dar presentes resultava em proteção ainda maior. Uma refeição em conjunto fornecia uma proteção adicional e ajudava a trazer as bênçãos dos espíritos bons. Portanto, a festa de aniversário natalício destinava-se originalmente a proteger a pessoa do mal e garantir que tivesse um bom ano.’ — Birthday Parties Around the World, 1967.

Este livro também explica a origem de muitos costumes relacionados com aniversários natalícios. Por exemplo: “O motivo [de se usarem velas] remonta aos antigos gregos e romanos, que criam que círios ou velas tinham qualidades mágicas. Eles oravam e faziam pedidos a ser levados para os deuses pelas chamas das velas. Os deuses enviariam então suas bênçãos e talvez respondessem às orações.” No entanto, como já mencionado, algo mais está envolvido nesta questão do que apenas se celebrar aniversários natalícios era ou ainda é uma atividade religiosa. A Bíblia menciona o assunto de natalícios, e os cristãos maduros sabiamente são sensíveis a quaisquer indícios que ela forneça.

Os servos de Deus da antiguidade observavam quando alguém nascia, o que lhes permitia calcular idades. Lemos: “Noé veio a ter quinhentos anos de idade. Depois, Noé se tornou pai de Sem, Cã e Jafé.” “No seiscentésimo ano da vida de Noé, ...romperam-se todos os mananciais da vasta água de profundeza.” — Gênesis 5:32; 7:11; 11:10-26.

Conforme até mesmo Jesus mencionou, entre o povo de Deus, o nascimento de crianças era um acontecimento abençoado e feliz. (Lucas 1:57, 58; 2:9-14; João 16:21) No entanto, o povo do Verdadeiro Deus não comemorava a data do nascimento; celebravam-se outros aniversários, mas não aniversários natalícios. (João 10:22, 23) A Encyclopaedia Judaica diz: “A celebração de natalícios é desconhecida no tradicional ritual judaico.” O livro Customs and Traditions of Israel comenta: “A celebração de aniversários natalícios foi emprestada dos costumes de outras nações, visto que não se faz menção deste costume entre os judeus, quer na Bíblia, quer no Talmude, ou em escritos dos Sábios posteriores. Tratava-se, de fato, dum antigo costume egípcio.”

Desta forma, o povo do Verdadeiro Deus, esforça-se a manter-se puros e sem manchas de práticas religiosas pagãs, enraizadas no demonismo, e portanto desaprovadas por Deus. Neste sentido, obedecem de perto o que Paulo mencionou em 2 Corintios 6:14-18: Não vos ponhais em jugo desigual com incrédulos. Pois, que associação tem a justiça com o que é contra a lei? Ou que parceria tem a luz com a escuridão? Além disso, que harmonia há entre Cristo e Belial? Ou que quinhão tem o fiel com o incrédulo? E que acordo tem o templo de Deus com os ídolos? Pois nós somos templo dum Deus vivente; assim como Deus disse: “Residirei entre eles e andarei entre [eles], e eu serei o seu Deus, e eles serão o meu povo.” “‘Portanto, saí do meio deles e separai-vos’, diz Jeová, ‘e cessai de tocar em coisa impura’”; “‘e eu vos acolherei’”. “‘E eu serei pai para vós e vós sereis filhos e filhas para mim’, diz Jeová, o Todo-poderoso.”

Não precisam de um dia específico para reafirmarem o amor à pessoa, para reunirem-se, para presentarem-se, para alegrar-se.

por WDR na internet

maio 14, 2007

de longe...



...No romance de Joaquim Manoel de Macedo, Memórias de um sargento de milícias, observa-se que a aproximação era mais fácil nas classes populares quando comparada com as elites. O namoro de Leonardo, filho de uma “valente pisadela” e um “tremendo beliscão”, com a filha da comadre rica, D. Maria, não tinha nada de restritivo. Ao contrário, não havia sequer vigilância cerrada sobre o casal que se encontrava só, muitas vezes. Da mesma forma, a passagem de Leonardo pela casa de Tomás da Sé permite a ele namorar, beijar uma das moças sem nenhum problema.
...No meio rural, tudo indica, seguiam-se regras estritas. Um exemplo é a descrição que a personagem Dona Picucha Terra Fagundes — do romance épico O tempo e o vento do escritor gaúcho Érico Veríssimo — faz sobre amores do Sul em meados do séculos XIX:

Pra contar não tenho muito. Mas sou filha do velho Horácio Terra, negociante no Rio Pardo. Me casei muito menina com um tropeiro de Caçapava. Quem me escolheu marido foi meu pai, sem pedir a minha opinião. Quando vi, estava noiva. O moço vinha uma vez por semana, mas ficava na sala proseando com o Velho. Eu mal tinha licença pra espiar pela fresta da porta. E fomos muito felizes, graças a Deus Nosso Senhor.

in História do amor no Brasil; Priore, Mary Del – Contexto – São Paulo, 2005 – Ilustração Waldomiro Sant’Anna

maio 12, 2007

Dedicatória


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Ter-te tido tão tarde
A mão amada amar macio
Ver voltar várias vezes
Sucedendo-se sempre
O orgasmo único
Presente, permanente, próximo
E dizer, doce dizer, somente
Mamãe, mamãe, mamãe...

in O Lamento de Píndaro; Pimentel, Cid – Hucitec – São Paulo, 1987

maio 09, 2007

O olho de Picasso


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O olho de Picasso viu Guernica
Eu vi o olho de Picasso
Por cima, por sobre, por fim
Por baixo, por dentro, por tudo
Pode porventura haver o olho
O olho de Picasso, o dos dedões dos pés?
Antes do vídeo, antes do áudio
Antes do hoje, do chip, do soft e do pós
Antes até do minotauro, o antigo
Antes mesmo da Pérsia, das Índias e do Egito
Antes de ti, também, leitor
O olho de Picasso viu Guernica
É bom portanto um bom lavolho
Ou água boricada, fria
Ou mesmo o suco dissolvido de um limão
Ou ler as cartas
Ou ver o sol
Ou fixar atento a luz de um refletor
Antes de ver, você, o olho de Picasso

in O Lamento de Píndaro; Pimentel, Cid – Hucitec – São Paulo, 1987