novembro 28, 2009

Bruzundangas



A gente da Bruzundanga gosta de raciocinar por aforismos. Sobre todas as cousas, eles têm etiquetadas uma coleção deles.

Se se fala em uma sala ou em outro qualquer lugar de sociedade de cousas literárias, logo um aforista sentencia:

— A arte deve ser impessoal. Os grandes artistas, etc.

Naturalmente, ele se lembrou de Dante, que pôs no inferno os seus inimigos e no céu os seus amigos.

Incapaz de fazer aparecer do seu seio razoáveis manifestações intelectuais, ela é ainda mais incapaz de apoiar as que nascem fora dela.

A pintura, que sempre foi arte dos ricos e abastados, não tem, na Bruzundanga, senão raros amadores. Os pintores vivem à míngua e, se querem ganhar algum dinheiro, têm que se rojar aos pés dos poderosos, para que estes lhes encomendem quadros, por conta do governo.

Porque eles não os compram com o dinheiro seu, senão os de vagas celebridades estrangeiras que aportam às plagas do país com grandes carregações de telas. É outro feitio da gente imperante da Bruzundanga de só querer ser generosa com os dinheiros do Estado. Quando aquilo foi império, não era assim; mas, desde que passou a república, apesar da fortuna particular ter aumentado muito, a moda da generosidade à custa do governo se generalizou.

Se um desses engraçados mecenas julga que deve proteger tal ou qual pessoa; que esta precisa viajar a Europa, aperfeiçoar-se, não lhe subvenciona a viagem, não tira nem um ceitil dos seus mil e mais contos. Sabem o que faz? Influi para que ele receba um pagamento indevido do Tesouro ou promove uma fantástica comissão para o indivíduo.

É assim o mecenato da Bruzundanga. A falta de generosidade e a sua inquietude pelo dia de amanhã ferem logo a quem examina a sociedade daquele país, mesmo perfunctoriamente.

Basta ler os testamentos dos seus ricos e compará-los com os que fazem os humildes iberos, que lá enriqueceram em misteres humildes, para sentir a inferioridade moral da sociedade da Bruzundanga.

Nestes últimos, há mesmo um grande pensamento da hora da morte, quando fazem legados a amigos, a parentes afastados, a criados, a instituições de caridade; mas, nos daqueles, só se topa com o mais atroz egoísmo. Lembro-me de um ricaço de lá que, ao morrer, fez avultados legados aos netos, filhos de sua filha, com a condição de que deviam usar o nome dele — cousa que, como se sabe, se não é contrária às leis, ofende os costumes. O sobrenome tira-se do do pai, lá como aqui.

Por falar em cousas de morte, convém recordar que os cemitérios dessa gente, ou por outra, os túmulos das pessoas da alta roda da Bruzundanga são outra manifestação da sua pobreza mental.

São caros jazigos ou carneiros de mármore de Carrara, mas os ornatos, as estátuas, toda a concepção deles, enfim, é de uma grande indigência artística. Raros são aqueles que pedem a escultores que os façam. Todos os encomendam a simples marmoristas, que os recebem, aos montes, da Itália.

As suas casas são desoladoras arquitetonicamente. Há modas para elas. Houve tempo em que era a de compoteiras na cimalha; houve tempo das cúpulas bizantinas; ultimamente era de mansardas falsas. Carneiros de Panúrgio...

A sua capital, que é um dos lugares mais pitorescos do mundo, não tem nos arredores casas de campo, risonhas e plácidas, como se vêem em outras terras.

Tudo lá é conforme a moda. Um antigo arrabalde da capital que, há quantos anos era lugar de chácaras e casas roceiras, passou a ser bairro aristocrático; e logo os panurgianos ricos, os que se fazem ricos ou fingem sê-lo, banalizaram o subúrbio, que ainda assim é lindo.

Um dos toques da mediocridade da sociedade da Bruzundanga é a sua incapacidade para manter um teatro nacional.

O teatro é por excelência uma arte de sociedade, de gente rica. Ele exige vestuários caros, jóias, carros — tudo isso que só se pode obter com a riqueza. Pois os ricos da Bruzundanga não animam as tentativas que se têm feito para fazer surgir um teatro indígena, e todas têm fracassado.

Ela se contenta com a ópera italiana ou com as representações de celebridades estrangeiras.

Poderia ainda falar nas suas festas íntimas, nos seus casamentos, nos seus batizados, nas suas datas familiares; mas, por hoje, basta o que vai dito, e é o bastante para mostrar de que maneira a aristocracia da Bruzundanga é incapaz de representar o papel normal das aristocracias: criar o gosto, afinar a civilização, suscitar e amparar grandes obras.

Se falei aqui em aristocracia, foi abusando da retórica. O meu intento é designar com tão altissonante palavra, não uma classe estável que detenha o domínio da sociedade da Bruzundanga, e a represente constantemente; mas os efêmeros que, por instantes, representam esse papel naquele interessante país.

Explicado este ponto, posso ir adiante nas minhas breves “notas” sobre o país da Bruzundanga.



in Os Bruzundangas; Barreto, Lima – Editora Brasiliense – S.Paulo, 1956
Imagem: Mantegna, Andrea "The Agony in the Garden" c. 1450; Têmpera sobre madeira — 63 x 80 cm – National Gallery, London

outubro 31, 2009

Imaginário



Teatro Atuação – 1988 – O doente imaginário, de Molière – Direção: Silnei Siqueira – Ariel Moshe, Bruno Barroso e Cid Pimentel.

Guran in wonderful Zelin



Foto: Guinigui

outubro 30, 2009

outubro 09, 2009

Prega



“O conflito é luz e sombra, perigo e oportunidade, estabilidade e mudança, fortaleza e debilidade. O impulso para avançar e o obstáculo que se opõe a todos os conflitos contêm a semente da criação e da desconstrução”.


in A Arte da Guerra, século VI a. C. – Sun Tzu (544-496 a.C)
Foto: Plexo – Adriana Gragnani

outubro 05, 2009

Um etc de um tao



Nemorino.

Nemorino
Una furtiva lagrima
negli occhi suoi spuntò...
quelle festose giovani
invidiar sembrò...
Che più cercando io vo?
M'ama, lo vedo.
Un solo istante i palpiti
del suo bel cor sentir!..
Co' suoi sospir confondere
per poco i miei sospir!...
Cielo, si può morir;
di più non chiedo.

Eccola... Oh! qual le accresce
beltà l'amor nascente!
A far l'indifferente
si seguiti così finché non viene
ella a spiegarsi.


in L'elisir d'amore, Donizetti, Gaetano; Atto secondo, Scena settima. Milano, Teatro della Canobbiana (12 May 1832) opera.stanford.edu
Imagem: Solanum dulcamara by Guido Gerding

outubro 03, 2009

Solanum



Meu cafezal em flor, quanta flor meu cafezal
Meu cafezal em flor, quanta flor meu cafezal
Ai menina, meu amor, minha flor do cafezal
Ai menina, meu amor, branca flor do cafezal
.
Era florada, lindo véu de branca renda
Se estendeu sobre a fazenda, igual a um manto nupcial
E de mãos dadas fomos juntos pela estrada
Toda branca e pefumada, pela flor do cafezal
.
Meu cafezal em flor, quanta flor do cafezal
Meu cafezal em flor, quanta flor meu cafezal
Ai menina, meu amor, minha flor do cafezal
Ai menina, meu amor, branca flor do cafezal
.
Passa-se a noite vem o sol ardente bruto
Morre a flor e nasce o fruto no lugar de cada flor
Passa-se o tempo em que a vida é toda encanto
Morre o amor e nasce o pranto, fruto amargo de uma dor
.
Meu cafezal em flor, quanta flor meu cafezal
Meu cafezal em flor, quanta flor meu cafezal


in Flor do cafezal; Cascatinha e Inhana
Imagem: Reclaiming Lost Youth in portrait-gallery.net

setembro 06, 2009

Itália Canta



Faccetta Nera
M. Ruccione


Se tu dall'altipiano guardi il mare,
moretta che sei schiava fra gli schiavi,
vedrai come in un sogno tante navi
e un tricolore sventolar per te...

Faccetta nera,
bell' Abissina
aspetta e spera
che già l'ora s'avvicina!
Quando saremo
insieme a te
noi ti daremo
un'altra legge e un altro Re!

Faccetta nera, piccola Abissina,
ti porteremo a Roma, liberata.
Dai sole nostro tu sara i baciata,
sarai camicia nera pure tu.
Faccetta nera,
sarai romana.
La tua bandiera
sarà sol quella italiana!
Noi marceremo
insieme a te
e sfileremo
davanti al Duce e davanti ai re!


Essa canção difundiu-se rapidamente e teve um grande sucesso na metade dos anos trinta. Lançado como propaganda em 1935, foi depois proibida porque respondia mais ao espírito popular inclinado para a despreocupada ternura que aos deveres de uma nação guerreira e colonizadora. A canção cantava a amizade por uma raça que deveria ser considerada inferior.


in Itália Canta; Marrone, Fiore Giuseppe e Daiocchi, Emilio – Sagra Luzzatto – Porto Alegre, 1998
Imagem: Detalhe do pano de boca do palco do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, fundado em 1909. Ao centro, a imagem de D. Pedro II. Obra do artista Eliseu Visconti, recentemente restaurada. Foto: Anibal Bragança

agosto 07, 2009

Humor cinza


Foto: Divulgação/Governo SP
.

julho 17, 2009

Seu Sami


HILAL SAMI HILAL. Instalação Sherazade (detalhe), da mostra Seu Sami – Palácio das Artes, Belo Horizonte, 2008. Foto: Paulo Lacerda


HILAL SAMI HILAL. Instalação Biblioteca (detalhe), da mostra Seu Sami – Palácio das Artes, Belo Horizonte, 2008. Foto: Paulo Lacerda.


HILAL SAMI HILAL. Instalação Biblioteca (detalhe), da mostra Seu Sami – Palácio das Artes, Belo Horizonte, 2008. Foto: Paulo Lacerda.


HILAL SAMI HILAL. Instalação Biblioteca (detalhe), da mostra Seu Sami – Palácio das Artes, Belo Horizonte, 2008. Foto: Paulo Lacerda.


HILAL SAMI HILAL. Instalação Biblioteca (detalhe), da mostra Seu Sami – Palácio das Artes, Belo Horizonte, 2008. Foto: Paulo Lacerda.


Hilal Sami Hilal (Vitória, ES, 1952).
Vive e trabalha em Vitória, ES.

Capixaba de origem síria, Hilal Sami Hilal iniciou-se, nos anos 1970, no desenho e aquarela para depois decidir se aprofundar em técnicas japonesas de confecção do papel. A partir daí, com uma viagem ao Japão, sua pesquisa intensificou-se, resultando numa segunda viagem a esse país no final dos anos 1980. Cruzando influências culturais entre o Oriente e o Ocidente, entre a tradição moderna ocidental e a antiga arte islâmica, surgiram suas “rendas”. Confeccionadas com um material exclusivo, criado com celulose retirada de trapos de algodão e misturada com pigmentos, resina e pó de ferro e de alumínio, as rendas privilegiam a força gestual do artista. Que assim constrói a tela a partir de linhas que se cruzam, de cores que se revelam na mistura dos materiais e da sensação de ausência gerada pelos espaços em branco. O trabalho, colocado a curta distância da parede, beneficia-se das sombras projetadas, criando um rendilhado virtual. Algumas de suas obras são realizadas apenas com resina acrílica, criando o mesmo efeito visual. Esteve no Panorama da Arte Brasileira, MAM/SP, em 1998. Em 2007/2008 teve uma grande mostra de sua obra exposta no Museu da Vale, Vitória, Espírito Santo, com curadoria de Paulo Herkenhoff.


Imagens:

julho 12, 2009

Casablanca



Te acalma, minha loucura!
Veste galochas nos teus cílios tontos e habitados!
Este som de serra de afiar as facas
não chegará nem perto do teu canteiro de taquicardias...
Estas molas a gemer no quarto ao lado
Roberto Carlos a gemer nas curvas da Bahia
O cheiro inebriante dos cabelos na fila em frente no cinema...
As chaminés espumam pros meus olhos
As hélices do adeus despertam pros meus olhos
Os tamancos e os sinos me acordam depressa na madrugada feita de binóculos de gávea
e chuveirinhos de bidê que escuto rígida nos lençóis de pano


in A teus pés; Cesar, Ana Cristina – Editora Ática – São Paulo, 1998
Fotografia: Regina Stella

julho 11, 2009

Quadrinhas P'ssoanas



18.

Vale a pena ser discreto?
Não sei bem se vale a pena.
O melhor é estar quieto
E ter a cara serena.

22.

Levas chinelas que batem
No chão com o calcanhar.
Antes quero que me matem
Que ouvir esse som sem parar.

24.

Teus brincos dançam se voltas
A cabeça a perguntar.
São como andorinhas soltas
Que inda não sabem voar.

38.

Ouvi-te cantar de dia.
De noite te ouvi cantar.
Ai de mim, se é de alegria!
Ai de mim, se é de pesar!

40.

O malmequer que arrancaste
Deu-te nada no seu fim,
Mas o amor que me arrancaste,
Se deu nada, foi a mim.

50.

O burburinho da água
No regato que se espalha
É como a ilusão que é mágoa
Quando a verdade a baralha.

61.

Eu te pedi duas vezes
Duas vezes, bem o sei.
Que por fim me respondesses
Ao que não te perguntei.

85.

Tenho um livrinho onde escrevo
Quando me esqueço de ti
É um livro de capa negra
Onde inda nada escrevi


96.

Dei-lhe um beijo ao pé da boca
Por a boca se esquivar.
A idéia talvez foi louca,
O mal foi não acertar.

140.

Há um doido na nossa voz
Ao falarmos, que prendemos:
É o mal-estar entre nós
Que vem de nos percebemos

146.

Tem a filha da caseira
Rosas na caixa que tem.
Toda ela é uma rosa inteira
Mas não a cheira ninguém.

177.

Compreender um ao outro
É um jogo complicado,
Pois quem engana não sabe
Se não estava enganado.

182.

Tens um anel imitado
Mas vais contente de o ter.
Que importa o falsificado
Se é verdadeiro o prazer.

202.

Fiz estoirar um cartucho
Contra a parede do lado.
Assim farei eu à vida,
Que o sonhar fez-me assoprado.

220.

Deixaste cair no chão
O embrulho das queijadas.
Riste disso — e porque não?
A vida é feita de nadas.

223.

Tenho uma pena que escreve
Aquilo que eu sempre sinta.
Se é mentira, escreve leve.
Se é verdade, não tem tinta.

324.

No dia de S. João
Há fogueiras e folias
Gozam uns e outros não,
Tal qual como os outros dias.


in Quadras ao gosto popular; Pessoa, Fernando – Edições Ática – Lisboa, s/d
Ilustração: "Papai dormiu", Ana Maria Dias

Os perigos da literatura



Literatura, isto é, escrever sem publicar, é uma espécie de vício secreto. Pequena perversão. Que nem colocar calcinhas de mulher. Seus praticantes estão sujeitos a muito mais. Olhai uns pares deles.

COMPLEXO DE CASTRO ALVES — Leva os poetas a delirar se imaginando numa tribuna em praça pública, cercado por um mar de povo, recebendo o brado do seu bardo, o verbo quente e a exortação para a ação.
Os poetas afetados deste mal substituem a ação pela palavra.

COMPLEXO DE MACHADO DE ASSIS — Manifesta-se em um desejo irreprimível de entrar para o Serviço Público. Levar vida reservada e tímida. Ter atitudes ambíguas sobre os problemas da comunidade. Esperar a glória, pacientemente. Alguns casos mais graves levam os pacientes a fundar academias.

COMPLEXO DE JORGE AMADO — Leva os pacientes a escrever livros e mais livros, sofregamente, uns cada vez mais parecidos com os outros. Freqüentemente, vence pelo cansaço e acorda consagrado internacionalmente. Pertence ao quadro deste complexo o sonhar com o Nobel.
Alguns têm frenesis em que se imaginam traduzidos para 18 idiomas.

MAL DE ROSA — Só faz vítimas entre membros do Corpo Diplomático.
O paciente imagina que é um jagunço do sertão.
Conta casos estranhos, numa linguagem meio antiga e meio sertaneja.
E diz em entrevistas na Europa: — Nós, no sertão...

SÍNDROME DE BORGES — O escritor-paciente imagina-se dentro de um livro, atacado por citações, vidas de outros séculos. Para o paciente afetado desta moléstia, o céu não tem estrelas.
Tem asteriscos.
Ocorre de o paciente, andando em círculos, tropeçar numa vírgula, engolir o parágrafo e bater com a cabeça num travessão.
Devem ser constantemente vigiados.
Se não melhorarem, o jeito é encaderná-los e doá-los a uma Biblioteca Pública.

MAL DE DRUMMOND — Apenas uma variante do Complexo de Machado de Assis.
O doente pode apresentar dores abdominais.
Bem na altura de Minas Gerais no mapa do Brasil. A seguir, os delírios.
O paciente grita:
— Tirem essa pedra do meio do meu caminho!

ATAQUE A JOÃO ANTONIO — Os acometidos desse mal crêem-se jogadores de sinuca, malandros da noite e velhos boêmios. Alguns tentam se parecer com Adoniran Barbosa. Quando alguém disser "literatura é um corpo-a-corpo com a vida", esteja certo: ali está alguém sofrendo do Mal de João Antônio. Vivem normalmente de uma dieta de Gorki e Lima Barreto. O melhor modo de curá-los é convidá-los para uma partida de sinuca.

PARALISIA CABRALINA — Súbito enrijecimento do nervo poético, causado por leituras intensivas da obra de João Cabral de Mello Neto. O cabra da peste acometido desse mal começa a ver tudo em quadradinhos e a só reconhecer rimas toantes. Nos casos mais graves, desenvolve pedras nos rins, na bexiga e na veia. Apresenta tendências para a litogravura, a marmoraria, ou coleciona cristais. Tem coração de pedra, e só se comove com agrestes, caatingas e canaviais pernambucanos. Normalmente, leva uma vida e morte severina.


in Ensaios e Anseios Crípticos; Leminski, Paulo – Pólo Editorial do Paraná – Curitiba, 1997

julho 10, 2009

Memória futura



Mesmo coberta,
Brasília é uma cidade
nua. Intervalos,
espaço, o plano em que se inventa
se despojam, verticalmente.
Planalto, Brasília salta
e se repete para o alto.

E comemora-se, num céu
declarado, num horizonte
preciso, como quem sabe
o que faz de si
e guarda o rosto explícito.

Em que cidades os vãos
se mostram com tanto
azul, e ventos e vertentes?
Onde limites
que se correspondam
onde lacunas que se preencham
apontando
sua vizinha evidência?
Onde o que é
guarda tanto sentido
em sua diferença?

Os edifícios, nítidos
como cactos, contra uma terra
envôlta em terra
se amaciam e se retomam em lago.
E o branco é mais longo
no afsalto do poente
e a técnica se arredonda
na memória da Acrópole
e a pergunta do ser
e pelo ser
se aconchega, nas dobras
do existente.

Nada se aglomera
ou se expulsa
nesta paisagem onde a razão
é o sensível e sua imagem.

Aqui se faz o homem:
geografia-geometria
e a história murmurando
amanhã
nas curvas da poesia.
Aqui a terra se ergue
lapidada em seu provento
aqui medita
o que a pátria espera
de nós, por nós,
na nudez dos que pensam.

Brasília, 1969


in Poemas ao outro; Garaude, Lupe Cotrim – Niamar – São Paulo, 1970
Ilustração: Guinigui over Lucio Costa

V



roleta de vertigens. orvalho imigrante
.....mariscos suspirando na paella
...........carcarás dormindo na tua alma.
..................as lágrimas rosnam.
..................................jardins com pitangueiras.
.............um bilhão de meteoros em férias
..............................& você põe fogo no bar.
.............maneira brejeira de agradecer
..........................o mixto-quente.

(lição de..........
amor para serpentes)


in 20 poemas com brócoli; Piva, Roberto – Massao Ohno - Roswitha Kempf – São Paulo, 1981
Ilustração: João Pirahy

((O)) DIO))



Rogério: Torquato, você acha que está cumprindo seu dever de brasileiro?
Torquato: Yes.
Rogério: Por que você respondeu em inglês?
Torquato: Devido a minha formação Joaquim Nabucol de comunista.
Rogério: Presentemente está atuando em alguma emissora?
Torquato: Não.
Rogério: Em inglês ou português?
Torquato: Em português. Nós temos Bananas. Fale.
Rogério: Assim não, isso é plágio de João de Barro e Alberto Ribeiro. Que tem a declarar?
Torquato: Vinicius jamais escreveria isso. Vinicius é a minha miss Banana Real. Geraldo Vandré é um gênio.
Rogério: Você diz um gênio sexual ou matemático?
Torquato: Nunca dormi com ele.
Rogério: Por que, você sofre de insônia?
Torquato: Eu era viciado em psicotrópicos. Hoje em dia dou mais valor aos alcalóides
.........................................................................................................
................................................................
Rogério: Eu por minha parte dou mais valor aos aqualoucos.
Torquato: O Golias é ótimo.
Rogério: Ele já foi aqualouco?
Torquato: Yes.
Rogério: Você não acha que nós devemos tratar melhor os negros?
Torquato: Yes.
Rogério: Por exemplo lá em casa estamos há 2 meses sem empregada. Nesse sentido Malcolm X ou Bertrand Russel foram muito compreensivos. Veja o caso de Sérgio Pôrto com aquela estória do crioulo doido, puro racismo, e racismo paulista, o que é mais grave sendo ele cocarioca, isto é, carioca, não acha nego?
Torquato: Yes. Acho sim. Agora: o Bertrand Russel é mais branco do que Malcolm X. O que estarei querendo dizer com isso?
Rogério: Talvez que a noite deste século seja escura e de uma escuridão tão impotente que mesmo no seu âmago mais profundo não são pardos todos os gatos.
Torquato: Non sense. Auriverde pendão das minhas pernas que a brisa do funil beija e balança. Onde está funil leia-se mesmo Brasil. Nelson Rodrigues inventou a subliteratura e eu endosso.
Rogério: Mas você não acha que depois de C. Veloso já devemos começar a cuidar mais seriamente da superliteratura?
Torquato: Yes. Freud explica, não é mesmo?
Rogério: Seria se fosse. Mas tanto Freud como Sartre como Lévi-Strauss não passam de romancistas da Burguesia. E Lukacs?
Torquato: Foi o caso mais grave de Geraldo Vandré que já conheci. E com a desvantagem de ser tão polido como Leandro Konder. Só que de Romance ele não manjava bulhufas. Mas, não exageremos porque Lukacs é um moço de muito futuro.
Rogério: Além do mais, Torquato, todas as nossas tragédias ou melodramas individuais fazem parte de um projeto coletivo nosso. Nós fumamos maconha para ter um sucedâneo da fome dos operários e damos a bunda porque não entendemos bem a razão pela qual temos tantas bananas e os camponeses continuam tão desenxavidos.

S.P. 1968

in Os últimos dias de Paupéria; Neto, Torquato – Livraria Eldorado Tijuca – Rio de Janeiro, 1973
Ilustração: Detalhe da capa do livro por Ana Maria Silva de Araújo

julho 08, 2009

Brasil confirma 4 primeiros casos de gripe H1N1 no país



Reuters - 07/05/2009 19:14

BRASÍLIA (Reuters) - O ministro da Saúde, José Gomes Temporão, confirmou nesta quinta-feira os quatro primeiros caso da nova gripe H1N1 no Brasil.

"O vírus chegou ao Brasil", disse o ministro a jornalistas. "Todos passam bem", acrescentou Temporão.

Os casos da doença, que ficou conhecida como "gripe suína", estão nos Estados de São Paulo (2), Minas Gerais (1) e Rio de Janeiro (1). Três pacientes vieram do México e um dos Estados Unidos.

Nesta quinta a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou que decidiu manter na fase 5, numa escala que vai até 6, o nível de alerta de pandemia para a doença, que já matou 44 pessoas no México e duas nos Estados Unidos.

O primeiro país da América do Sul a ter caso da gripe confirmado foi a Colômbia. Em todo mundo, já existem mais de 2 mil casos confirmados, segundo a OMS.

(Reportagem de Ana Paula Paiva)