julho 08, 2007

Sumaúma


De pequenino se torce o pepino


Os mano

Amore — L. Bonfaro

Odio — L. Bonfaro
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in Novissima – Albo d'Arti e Lettere; Direttore: Fonseca, Edoardo de – Roma, 1904

Boi na linha


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(aparece a ema, enorme, correndo, dança junto depois, para junto do boi vazio e olha, espantada)

EMA — Ué! Cadê o recheio do boi? O boi esvaziou? Cadê o de dentro do boi?

ATOR — Eu estou aqui. O de dentro do boi, sou eu!

VIOLEIRO
O boi é boi só por fora,
o boi é gente por dentro
gente é seu sentimento
em qualquer dia e qualquer hora!
O boi é boi só por fora,
o boi é gente por dentro,
gente é seu sentimento,
na hora em que o boi vai embora!
Boi, por dentro, também chora!

EMA — Então, o boi é igual à Ema! Eu também sou gente por dentro. Quando alguém me maltrata, sofro igualzinho à gente!

VIOLEIRO — Você também é gente, por dentro, Ema? Você também tem sentimento?

EMA — Tenho. Também sou gente, por dentro. Igual a todo bicho! Igual a toda a gente!

VIOLEIRO — Então, Ema, sai de dentro, vem prá fora!

EMA(se requebrando, metendo a cabeça debaixo da plumagem) Eu tenho vergonha. Fico toda envergonhada!

TODOS, EM VOLTA DA EMA — Sai de dentro, vem pra fora, sai de dentro, vem pra fora, sai de dentro, vem pra fora...

Trecho de A Folia dos Três Bois; Orthof, Sylvia – SBAT, Revista de Teatro, nº 460 – Rio de Janeiro, 1968

julho 07, 2007

Noir


La Notte – Augusto Majani, Bologna

in Novissima – Albo d'Arti e Lettere; Direttore: Fonseca, Edoardo de – Roma, 1904

Auto da Barca do Inferno




in Teatro; Vicente, Gil – Livraria Lello & Irmão – Porto, sd

Auto da Feira


...A peça tem prólogo, dito por Mercúrio, que, discreteando sôbre astronomia, usa de sentenças semelhantes às do prólogo da «Exortação da Guerra». No final, diz quem é e ao que vem: que por não conhecer na côrte de Portugal feira no dia de Natal, ordena ali uma, nomeando mercador-mor ao Tempo. Entra êste, anunciando várias mercadorias, entre elas a Justiça, a Verdade, a Paz, o Temor de Deus, etc. A seguir vem um Serafim e convida para a feira os mosteiros, as igrejas, os pastores de almas, «os papas adormidos», a quem exorta a que regressem à vida humilde e simples dos primitivos tempos da Igreja.
...Aparece o Diabo, «como bufarinheiro», e gaba-se de que há de vender com tôda a facilidade a sua avariada mercadoria. Discute o assunto com o Tempo e com o Serafim.
...Surge Roma, a Igreja, que vem comprar Paz, Verdade e Fé. Gil Vicente, pela boca do Diabo, dirige-lhe cruéis censuras e ataques.
...Desenvolve-se depois uma scena de dois compadres lavradores, que, a caminho da feira, falam das respectivas mulheres, uma brava, outra mansa, mostrando-se cada um dêles descontente com a sua. Surgem as mulheres e censuram os respectivos maridos, cujos defeitos apontam. Chegam à feira. Como uma das mulheres pronuncia a palavra —Jesus—, o Diabo desaparece. Dirigindo-se ao Tempo e ao Serafim, preguntam por mercadorias várias e enjeitam as que esses vendedores apregoam, como consciência, virtude, etc.
...Aparecem mais raparigas e rapazes, ordenam-se para feirar, e estabelece-se entre êles uma troca de ditos amorosos, que tornam animada a scena. Até que por fim todos cantam uma «folia» à Virgem em honra de quem se ordenara a feira.

in Teatro; Vicente, Gil – Livraria Lello & Irmão – Porto, sd

Epitáfio

No túmulo de Gil Vicente, em Évora, na Igreja de São Francisco:

«O gram juizo esperando
jaço aqui nesta morada
também da vida cansada
descançando.
Pergunta-me quem fui eu
atenta bem para mi
porque tal fui coma ti
e tal has de ser com'eu.
E pois tudo isto vem
ó lector, de meu conselho
toma-me por teu espêlho
olha-me e olha-te bem. »

julho 06, 2007

Amor le fa cantare


Il Ballo delle Rondini (Francesca da Rimini) – Luigi Brunelli, Milano

in Novissima – Albo d'Arti e Lettere; Direttore: Fonseca, Edoardo de – Roma, 1904

Segundo Ato

Leopoldo Fróes era impetuoso, exaltado. Desde tenra idade manifestou sua autoridade quando exigia os punhos e colarinhos engomados, ou quando mandava fritar três e quatro bifes até que ficassem ao seu gôsto.

Filho criado sem mãe, o pai sereno e gentil, não tinha a energia que o gênio impulsivo do garôto necessitava. Sua tia Yayá, carinhosa, sempre se recordando de que as crianças eram órfãs passava-lhes a mão pelas cabecinhas, e, muita vez, ocultava do Dr. Fróes suas travessuras e peraltices.

E o pricipiante ator Leopoldo Fróes correu a província do velho Portugal.
Na revista "A Volta do Mundo em 80 dias", Fróes fazia o papel de um brasileiro em Portugal.

Um ator da companhia, antipatizou com Fróes. Despeito, talvez, do jovem brasileiro que já demonstrava sua vocação teatral.

Numa cena em que havia uma briga, o ator português, aproveitando a oportunidade para se vingar do rapaz estrangeiro, por quem sentia uma antipatia gratuita, dirigiu-se ao colega dizendo:

— Vais ver, brasileiro, o que é um português. Assim dizendo deu um formidável pontapé em Leopoldo. Coisa que agradou ao grupo de colegas amigos do agressor.

Fróes, lembrou-se dos seus tempos de rapazola, quando treinava a "capoeira" no quintal de sua casa, lembrou-se dos capangas, nas esquinas das ruas nos dias de eleições no Brasil, lembrou-se do prêto Cipriano que o livrara e aos amigos, da surra dos cocheiros de bonde, e, respondeu ao ator que o ofendera:

— Vais ver o que é um brasileiro. E sapecou um "rabo de arraia" jogando por terra os seus antipatizantes que caindo sentados no chão tão bruscamente tiveram que evitar sentar-se por alguns dias.. .

A cena agradou. O público, que não se apercebera de que estava assistindo provocação e revide à valer, aplaudia a cena. Mas no espetáculo seguinte a cena foi moderada... e nos bastidores dizia-se a meia voz: "cuidado com o brasileiro... quem poderia esperar... um rapaz tão fino!"

Êsse incidente não teve importância. O rapaz continuou espalhando simpatia por onde andava e respeito aos atrevidotes.

Outra ocasião, Fróes estava vestido de rei para representar uma peça histórica. No fundo do palco havia um grande espelho, onde os artistas se miravam, antes de entrar em cena. Fróes teve uma altercação com um colega, palavra puxa palavra e de repente Fróes sentiu-se ofendido com qualquer coisa que lhe dissera o colega. Fróes, colérico, nos seus vinte e um anos de idade, sem pensar nas conseqüências, num gesto de tragédia, como pedia a "toillette" que vestia no momento, desembanhou a espada que trazia à cintura e investiu contra o colega.

Mas, Leopoldo, estava justamente em frente ao espelho do fundo do palco e, ao ver-se refletido naquela atitude grotesca, com uma cabeleira à inglêsa, meias altas, couraça no peito e um grande manto caído nas costas, deu uma gargalhada. O colega que esperava uma surra de espada, ao ouvir as risadas dobradas de Fróes, saiu correndo, julgando que o artista havia enlouquecido... Aí a cena tornou-se ainda mais cômica, tudo acabou bem, foi um rompante de seu gênio impulsivo.

Leopoldo Fróes cada vez mais se empolgava pela terra de seus avós, o sereno João Francisco da Cruz e o altivo Comendador Rodrigues Guimarães. Portugal a sua segunda pátria.

A estréia de Leopoldo Fróes numa grande companhia teatral, foi no Teatro Príncipe Real, em Lisboa, no dia 18 de novembro de 1903, na peça "O Rei Maldito", de Marcelino Mesquita. Fêz sucesso nesse grande teatro como já o fizera em outros de menor cartaz no Brasil e Portugal.

Começou a estudar e a exercitar a prosódia portuguêsa. Trabalhando em Portugal, com artistas portuguêses, era preciso que sua pronúncia não "desafinasse dos demais".

Em pouco tempo era um "alfacinha" falando.

Em 1905 ingressou na companhia José Ricardo — Teatro da Rua dos Condes. Aprendeu teatro. Dizia sempre Fróes que José Ricardo foi seu grande mestre.

Seu primeiro triunfo — substitui o galã Telmo. A crítica ocupa suas colunas com justos elogios ao ator brasileiro. Fróes não se envaidece, mas quer vencer.

Lembra-se da Pátria distante. Sente o sangue de artista latejar-lhe nas veias. Desdobra-se em esforços. Vence.

Começa aí sua vida entre conquistas. Conquistas artísticas e femininas...

Conheceu uma atriz — Maria Portuzellos, fadista de beleza extraordinária com quem passou a viver e trouxe-a consigo na primeira viagem ao Brasil, como ator.

Leopoldo e Maria viviam uma vida à apaches. A mulher que lhe tinha um ciúme doentio não o deixava um só instante. Aquilo enfezava-o. Brigavam. Faziam as pazes. Ambos geniosos as brigas eram violentas. Ambos muito jovens as pazes eram também violentas...

Certa ocasião, em Niterói, onde residiam, na Rua Saldanha Marinho, a portuguêsa no auge do ciúme deu-lhe uma dentada na mão. Leopoldo foi obrigado a recorrer à uma botica e o médico, antigo amigo, perguntou-lhe:

— Que bicho te mordeu, Popodo?

— Mulher, doutor. Respondeu-lhe Fróes.

Tendo terminado o contrato da companhia que o trouxe de volta á Pátria, deu uns espetáculos avulsos em vários teatros do Rio levando o drama de Discenta — "João José ", no qual fazia o papel de André, papel que foi sempre o seu nessa peça. Maria Portuzellos fazia a Rosa, agradando à platéia com sua beleza.

Maria era linda, ignorante e boa. Era uma fadista, alma de "Severa", cantava fados que Leopoldo acompanhava à guitarra e amava-o. Era um amor brutal.

De uma feita Luís Carlos foi visitar o mano Leopoldo e sua companheira Maria. O garôto, aproveitando a ausência do pai, que estava na Europa, escolheu uma artística bengala de sua coleção e lá saíu todo lampeiro convencido de que era um homem feito, com apenas 16 anos.


Prof. Luiz Carlos Fróes da Cruz (pai de Leopoldo) e D. Idalina da Conceição Rodrigues Guimarães Fróes da Cruz (mãe de Leopoldo)


Fróes em Lisboa (jovem ator) e Fróes em Paris


Leopoldo (4 anos) e Corinna (5 anos) no seu primeiro diálogo "A Floresta e o Estudante"

Encontrou um ambiente carregado — Leopoldo e Maria discutiam. A discussão tornou-se em briga. Leopoldo com aquêle gênio de rompantes, no auge da raiva agrediu Maria, essa repeliu-o, sem delicadeza alguma, é claro. Vai daí Leopoldo apanha a bengala que estava num canto encostada à parede e suspende-a para quebrar as costelas da portuguêsa.

Luís deu um grito de horror:

— Não, Popodo!... com essa bengala, não!... que é de papai!

Leopoldo e Maria desataram a rir... a briga terminou.

Maria, rindo, beijou o garôto Luís Carlos:

— Se a bengala não fôsse do papai.....

***

in Leopoldo Fróes; Fróes, Iris – Companhia Nacional de Teatro; MEC – Rio de Janeiro, 1960

Lúmen


La Lucciola – Carlo Balestrini, Milano

in Novissima – Albo d'Arti e Lettere; Direttore: Fonseca, Edoardo de – Roma, 1904