abril 16, 2007

A cor da pobreza



...A elaboração de estratégias para melhoria da qualidade de vida e de saúde depende da compreensão das fragmentações derivadas dos fenômenos socioculturais, políticos e econômicos, seja no nível pessoal, coletivo, regional ou mundial.
...O mundo atual nega liberdades elementares a um grande número de pessoas. Por vezes, a ausência de liberdades substantivas relaciona-se diretamente com a pobreza econômica, em alguns casos vincula-se à carência de serviços públicos e assistência social e, em outros, a violação da liberdade resulta diretamente de uma negação de liberdades políticas e civis.
...No Brasil, o grau de pobreza é mais elevado do que o encontrado em outros países com renda per capita similar. Embora cerca de 64% dos países tenham renda inferior à brasileira, aqui o grau de desigualdades é um dos mais elevados do mundo (Barros e col., 2000).
...A pobreza no Brasil tem raça/cor, sexo e etnia. Esta afirmação, interpretada por alguns como esquizofrênica, está pautada em números tão cruéis quanto seu reflexo nos corpos e nas mentes de negros e negras, índios e índias. 11
...De acordo com os dados analisados por Jaccoud e Beghnin (2002), em 1992,40,7% da população brasileira era considerada pobre; em 2001, esse percentual cai para 33,6%. Nesse período, a proporção de negros pobres equivalia a 2 vezes a proporção observada na população branca -55,3% versus 28,9% em 1992 e 46,8% versus 22,4% em 2001. Nesse ano, homens e mulheres apresentaram-se distribuídos de forma semelhante entre os pobres — cerca de 1/3 da população. Ao incluir a variável raça/cor na análise dos dados, entretanto, observou-se que esta situação era vivida por quase metade das mulheres negras contra apenas 22,4% das mulheres brancas. Na indigência, a proporção de mulheres e homens negros foi cerca de 28% em 1992 e 22% em 2001, contudo este percentual foi 2,3 vezes maior quando comparado àquele apresentado para mulheres e homens brancos em 1992 e 2,6 vezes maior em 2001.
...Segundo Milton Santos (2000), os pobres não estão apenas desprovidos de recursos financeiros para consumir, a eles é oferecida uma cidadania abstrata; que não cabe em qualquer tempo e lugar e que, na maioria das vezes, não pode ser sequer reclamada. Por mais que se deseje negar, essa cidadania não consistente e não reivindicável, vem sendo oferecida ao longo dos tempos, prioritariamente aos negros e negras, índios e índias.
...Se cidadania é o repertório de direitos efetivamente disponíveis, os coletivos cujo Estado não garante os meios para o desenvolvimento, não têm condições de exercer atividades globalizadas. Para estes brasileiros a transposição das barreiras socioeconômicas é quase impossível.

11 Neste texto não serão abordadas questões relativas às condições de vida e saúde da população indígena.

in Seminário da Saúde da População Negra; Batista, Luís Eduardo e Kalckmann, Suzana (Org.) – Instituto de Saúde – São Paulo, 2005

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