fevereiro 13, 2007

Capítulo XXXII

AS MINAS DE OURO
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A transformação por que passou o Brasil. O formigueiro.
A loucura. O luxo. Os nababos. A decadência

.. .O ouro que, por muito e muito tempo, teimou em não se mostrar aos olhos dos homens, no momento em que se apresentou, foi numa abundância de espantar. Por toda a região central da antiga Pindorama, nas montanhas de Minas, nos sertões de Goiás e de Mato-Grosso, descobriram-se minas e minas de ouro das mais ricas e das mais deslumbrantes.
.. .Os descobrimentos dás minas produziram no Brasil uma profunda transformação. Parou o trabalho dos campos, parou a lavoura; as fazendas e os engenhos ficaram abandonados de uma hora para outra.
– Por que? interroguei.
– Porque, sendo o ouro a fortuna fácil, todos corriam para as minas na esperança de encontrar a fortuna.
.. .Foi uma tentação, um verdadeiro delírio. O ouro! o ouro!
.. .Os comerciantes largaram os negócios, os operários largaram as oficinas, os funcionários públicos desprezaram os empregos, até os magistrados, até os militares, até os sacerdotes, abandonaram os deveres e se puseram a caminho dos tesouros.
.. .As estradas do sertão, principalmente dos sertões de Minas Gerais, pareciam verdadeiras ruas de cidades populosas. Um formigueiro. Gente de várias espécies e de várias idades.
.. .Parecia que o Brasil inteiro corria em busca da riqueza.
.. .A notícia atravessou os mares, chegou a Portugal, e espalhou-se pela Europa. O que já se dizia era realmente para endoidecer. Contava-se que os tesouros brasileiros eram tantos que havia serras e serras de ouro maciço, montanhas e montanhas em que as pedras só eram esmeraldas, safiras e rubis.
.. .A Europa assanhou-se. Muitas aldeias portuguesas vieram inteirinhas para o Brasil. O formigueiro humano, em caminho do sertão, cresceu. Houve uma quadra em que havia tanta gente nos caminhos que se tinha a impressão de que o mundo inteiro estava seguindo para as minas.
.. .A Quiquita interrompeu:
– E o ouro chegava para esse povão todo?
– Chegava., Não eram serras de ouro maciço, como se dizia, mas era ouro bastante para enriquecer a todos. Minas a dar com os pés. Mal se descobria uma, outras surgiam. Mal se ia esgotando uma, apareciam outras e outras maiores e mais ricas.
.. .E não se descreve o que foi a vida daqueles sertões. Parece mais um conto das Mil e uma Noites do que mesmo a realidade. Criaturas tornavam-se ricas da noite para o dia. Um luxo incrível. Viviam todos abarrotados de ouro. Todos, até os escravos. As negras vestiam sedas, cambraias caras e veludo.
.. .Foi a época dos grandes nababos (1). O padre Guilherme Pompeu de Almeida tinha uma fortuna incalculável. Na sua fazenda, em Araçariguama, havia cem quartos para hóspedes
e, em cada quarto, uma bacia de prata, uma cama de excelente madeira, com finos e lindos lençóis de linho.
.. .O barão de Catas Altas servia-se de baixelas de ouro; oferecia aos seus hóspedes nozes, castanhas e almôndegas de ouro maciço e mandava ferrar de ouro os seus cavalos para deslumbrar os matutos das estradas.
– E essa riqueza enorme ficava no Brasil? indagou o Neco.
– Não. Ia quase toda para Portugal. Os monarcas portugueses gastavam loucamente. Os navios levavam daqui para os reis portugueses arrobas e arrobas de ouro.
– Portugal ficou então muito rico? perguntei.
– Não. Os monarcas portugueses esbanjavam tudo, disse Vovô. Portugal ficou pobre apesar da imensa riqueza do Brasil.
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Os reis imaginavam que as minas não tinham fim. No mundo tudo acaba. As minas esgotaram-se. O luxo das zonas mineiras passou. Veio a pobreza. Essa fortuna incalculávelde que falei a vocês durou apenas um século.
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(1) Nababo – pessoa riquíssima que vive em grande luxo.
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Até as negras usavam sedas e jóias caras
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in História do Brasil para Crianças; Corrêa, Viriato – Companhia Editora Nacional – 1946 – Ilustrações de Belmonte

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